Os tumores pulmonares ainda lideram o ranking das doenças oncológicas que mais matam todos os anos, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS)
O tabagismo é o principal fator de risco para o câncer de pulmão, sendo responsável por cerca de 85% de todos os casos. Quem fuma tem aumentada cerca de 30 vezes mais a chance de desenvolver a doença. Esse risco diminui nas pessoas que param de fumar, mas ex-fumantes sempre estarão em maior probabilidade de ter câncer de pulmão do que pessoas que nunca fumaram.
Foi o que aconteceu com Renato Dias Filho, de 70 anos. O mestre de cabotagem fumou por 35 anos, e mesmo tendo parado de fumar há 23, teve o diagnóstico de câncer de pulmão confirmado este ano. “Eu não sentia nada. Tinha ido à endocrinologista para fazer o controle da diabetes e ela desconfiou por causa dos exames de sangue. Confirmei o diagnóstico com o especialista e fui operado no mês de maio. Depois da retirada do tumor, tenho me sentido bem, graças a Deus”. Mesmo com a grande incidência da doença na família, Renato não se deixou abater. “Eu tenho uma cabeça muito boa para lidar com essa doença, mesmo com minha família muito preocupada comigo. As pessoas que me conhecem chegam a não acreditar que passei por essa situação, mas para mim foi tranquilo. Deu tudo certo!”, conta aliviado.
Dados – No mundo, o câncer de pulmão configura-se entre as neoplasias mais comuns. Com uma estimativa de 2,2 milhões de novos casos de câncer e 1,8 milhão de mortes, o câncer de pulmão é o segundo mais diagnosticado e a principal causa de morte pela doença em 2020, representando aproximadamente um em cada 10 (11,4%) cânceres diagnosticados e um em cada 5 (18,0%) mortes.
No Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), é estimado que durante o triênio 2020-2022 cerca de 30.200 casos da doença sejam diagnosticados a cada ano, sendo 17.760 casos novos em homens e 12.440 em mulheres. A alta letalidade da doença reforça sua importância. O câncer de pulmão é o segundo tipo de câncer de maior incidência em homens e o quarto tipo de câncer de maior incidência em mulheres. É a principal causa de morte por câncer em homens e a segunda causa em mulheres.
De acordo com o cirurgião torácico, Pedro Leite, “o câncer de pulmão é resultado de mutações genéticas em células dos alvéolos pulmonares ou dos brônquios. Dessa forma, estas células desenvolvem propriedades diferentes, que possibilitam a proliferação desordenada, invasão de estruturas adjacentes e criar colônias em outros órgãos, quando ocorre as metástases”. O diagnóstico é feito através de exames de imagem como a tomografia de tórax. No entanto para o diagnóstico definitivo é necessária a realização de uma biópsia do tumor que pode ser feita através de punção guiada por tomografia, broncoscopia ou até mesmo por cirurgia, a depender do caso.
Tratamento – O tratamento para o câncer de pulmão depende da fase em que se encontra o tumor, como explica o cirurgião. “Inicialmente, o estadiamento é feito através do exame de imagem PET-Scan (para detectar metástases em outros órgãos) e ressonância magnética do crânio. A depender do resultado, em alguns casos pode ser necessária prosseguir a investigação com outros exames. Nas fases iniciais, o tratamento é a cirurgia, sendo em alguns casos necessária a complementação com quimioterapia. A extensão da cirurgia depende principalmente da localização, tamanho da lesão e condições clínicas do paciente”, salienta o diretor do Núcleo de Cirurgia Torácica do Instituto Baiano de Cirurgia Torácica (IBCR).
Tradicionalmente, a cirurgia era realizada através de uma toracotomia, ou seja, uma incisão na parede lateral do tórax de cerca de 12-15cm, seguida de afastamento das costelas. Atualmente, devido a avanços tecnológicos, é possível realizar a ressecção do tumor de forma minimamente invasiva como através da cirurgia por vídeo ou da cirurgia robótica, que é uma modalidade cirúrgica minimamente invasiva mais avançada.
A técnica é realizada através de pequenos orifícios na parede torácica, utilizando instrumentos finos, delicados e com auxílio de uma câmera de vídeo. “A plataforma robótica proporciona ao cirurgião uma visão mais ampliada e em 3D, superior até a imagem da videocirurgia. Além disso, os movimentos das pinças são mais amplos e precisos. Esses diferenciais tornam a cirurgia mais segura e eficiente, melhorando consideravelmente os resultados cirúrgicos, com uma recuperação pós-operatória mais rápida, período de internação hospitalar mais curto, com menos dor, e retorno precoce as atividades diárias normais. Os estudos atuais sugerem que a cirurgia robótica consegue realizar uma melhor retirada dos linfonodos intratorácicos em relação a cirurgia por vídeo. Os linfonodos são gânglios linfáticos que funcionam como um filtro de células do tumor que podem se espalhar pelo corpo. A sua retirada é fundamental para definir o grau de extensão da doença, interferindo diretamente no tratamento e na chance de cura do paciente”, explica Pedro Leite.
O uso da cirurgia robótica está cada vez mais frequente e já é uma realidade em todo o mundo. “Atualmente existem dezenas de robôs no Brasil, sendo que em Salvador temos quatro sistemas robóticos, sendo que ainda não há nenhum no interior do estado. No hospital em que trabalho em menos de três anos da implantação do robô já foram realizados quase 1.000 procedimentos robóticos. O notório benefício da tecnologia ao paciente associada a divulgação e conhecimento da população sobre a cirurgia robótica são uns dos grandes responsáveis por esse movimento”, explica o cirurgião.
Desafios no diagnóstico – Infelizmente, apesar dos grandes avanços do tratamento do câncer de pulmão, apenas uma pequena parcela dos pacientes pode ser submetida a terapia com intuito curativo. No Brasil, o câncer de pulmão é geralmente diagnosticado em estágios avançados e apresenta baixas taxas de sobrevida. No geral, aproximadamente 70% dos pacientes apresentam doença localmente avançada ou metastática no momento do diagnóstico. A maior prevalência do diagnóstico tardio pode ser explicada por diversos fatores, explica Pedro Leite. “Comumente o câncer de pulmão não causa sintomas em suas fases mais iniciais, tornando difícil o diagnóstico precoce. Na grande maioria dos casos, o diagnóstico precoce é feito de forma incidental, quando o paciente faz algum exame de imagem, seja radiografia ou tomografia de tórax, por motivo não relacionado ao câncer e é encontrado um nódulo pulmonar. Contudo, quando o tumor cresce e começa a invadir estruturas adjacentes, podem aparecer sintomas como tosse, escarro com sangue, dor torácica, falta de ar, rouquidão e perda de peso”.
Outro fator relevante é a falta ou dificuldade de acesso de grande parte da população ao serviço de saúde, principalmente no contexto da saúde pública. Além disso, apesar de estudos demonstrarem benefício, no Brasil ainda não temos um programa de rastreamento de câncer de pulmão estabelecido.
Prevenção – A prevenção é a estratégia mais eficaz para reduzir a mortalidade por câncer de pulmão a longo prazo. A legislação antitabagismo e as campanhas educativas devem ser intensificadas, principalmente com foco na população mais jovem. Programas para aumentar a conscientização do público em relação ao câncer de pulmão, diminuir o tempo de diagnóstico e melhorar o acesso a serviços de saúde especializados são algumas das necessidades mais importantes no combate ao câncer de pulmão e na melhoraria dos resultados terapêuticos. Outros fatores de risco são a poluição do ar, exposição à fumaça de tabaco (tabagismo passivo), história familiar de câncer de pulmão, além de exposição a carcinógenos, como amianto, radiação, radônio, uso exclusivo de fogueiras para cozinhar e aquecer.